De acordo com Carl Jung, o self pode ser descrito como a nossa essência ou aquilo que existe de mais único e peculiar na nossa personalidade. Muitas culturas, religiões e tradições filosóficas o reconhecem também como a alma ou até mesmo como o espírito. Dentro de uma visão científica, a própria psicologia analítica o tem como objeto de estudo, e alguns autores neo junguianos o descrevem também como o arquétipo central.
Assim, quando nascemos nós não possuímos ainda um ego formado. Porém nosso self já está ali, mas ainda não temos consciência dele. O ego então vai sendo formado ao longo do desenvolvimento, basicamente em função do processo de socialização, que se inicia primeiramente com os próprios pais e gradualmente vai se sobrepondo ao self. Por isso, as relações primárias com o núcleo familiar são tão importantes na formação do ego e assunto de grande parte das sessões de psicoterapia.
Isto se dá por uma
condição básica da vida humana: O ser humano não nasce completo, e o período
que vai até meados dos três anos de idade seria uma espécie de gestação
psicológica, na qual o ego está sendo encubado. Nesta fase a criança é
totalmente dependente dos pais para tudo na vida, especialmente da mãe em função
da amamentação. Sendo assim, seu instinto de sobrevivência básico é se sentir
amada e acolhida primeiramente pelos pais.
Assim, o ego é
formado pela leitura que a criança faz da expectativa dos pais sobre ela,
buscando obviamente desta maneira se sentir amada. Isto inclui, em grande
medida também as expectativas inconscientes, uma vez que por ainda não possuir
um ego formado, a criança está com o seu self
exposto ao inconsciente familiar.
Podemos
receber de herança psíquica tanto
estímulos positivos de amor e afeto, que se transformarão em potenciais de
realização e segurança pessoal. Como estímulos negativos de abandono ou
rejeição, que por ferirem o instinto básico de sobrevivência da criança, em função da dependência dos pais, provocam uma angústia terrível semelhante a uma sensação de quase morte.
Para se proteger
desta dor emocional se formam as defesas
psicológicas que darão origem as fixações
e posteriormente aos complexos,
frutos de grande insegurança psicológica e sofrimento emocional ao longo da
vida. Os complexos podem ser entendidos como reações emocionais que geram uma resposta fisiológica instintiva, que geralmente provoca um comportamento involuntário e inconsciente. Estas características atuam a partir das feridas do ego, que aprende desde cedo a
lutar pela aprovação externa, assim como a se proteger através dos complexos da falta dela. Para Jung, "o próprio ego pode ser visto como um complexo".
Dependendo de como
se dão as condições sociais e afetivas de desenvolvimento da primeira fase da
vida, lidaremos melhor ou pior com o sentimento de desaprovação social e
rejeição afetiva, que representam os nossos medos mais primitivos e geralmente
inconscientes. Quando conseguimos superar estes traumas e liberar a energia psíquica fixada, através das defesas nos complexos, podemos lidar melhor
com o sentimento de desaprovação externa e utilizar a energia psíquica como potencial para a conquista dos desafios que levam a auto aprovação.
O reconhecimento e a ancoragem no self
é uma das metas do processo de individuação, no qual a superação dos complexos inconscientes e a diferenciação entre as forças do ego e do self definem
a consciência sobre a própria individualidade. A palavra individuo significa o
indivisível ou aquele que não se divide.
Para a psicologia analítica o que não deve se dividir em última instância é a própria libido, sendo que um indivíduo íntegro, ou inteiro, é o dono da sua energia vital, possui as rédeas da vida em suas mãos e pode conduzi-la em direção à auto realização, uma vez que aprende a reconhecer os anseios de sua alma e passa a atendê-los. É importante ressaltar que a para Jung a libido não se resume à pulsão sexual como era vista por Freud, mas sim compreendida como energia psíquica que também tem como finalidade a realização do próprio self, através da função transcendente do ego.
Desta forma, o ego trabalha basicamente em função da aprovação externa sempre buscando o reconhecimento social, por isso também está muito associado no senso comum ao orgulho, como quando dizemos que determinada pessoa tem o ego inflado, ou busca uma massagem no ego.
A questão é que o
orgulho não é capaz de realizar o self,
somente a auto realização em um nível mais profundo é capaz de fazê-lo. Apenas cada indivíduo, olhando sinceramente para dentro de si mesmo e se conectando com a sua essência, pode reconhecer e
determinar o que pessoalmente o realiza. Seria correto afirmar que somente
através do self se pode ter auto
estima, pois ali reside a capacidade de agradar e ser estimado verdadeiramente por
si mesmo.
Buscar somente
agradar aos outros, sem agradar a si mesmo pode fazer bem ao orgulho e ao ego, mas não necessariamente trará auto
estima e realizará o self. Podemos
perceber quando estamos em função de um ou de outro exatamente quando estamos
presos em um destes pólos, sendo que o ideal é mantermos o equilíbrio entre
estas duas instâncias psicológicas que possuem funções importantíssimas na
nossa vida psicológica.
Para concluir, é
importante destacar que a verdadeira transcendência
do ego, não implica exatamente no seu abandono, o que poderia levar a uma
crise ou a própria loucura, mas sim reconhecer suas forças, principalmente na
dimensão social. Somente é possível transcender um ego que já esteja bem consolidado e estruturado. Para que futuramente, se possa equilibrar as pulsões internas com as externas,
favorecendo assim um bom equilíbrio psicológico através da integração dos opostos.
Isto é que o Jung chamava de estabelecimento do eixo ego-self.
Saiba mais sobre estes conceitos no curso de Introdução à Psicologia Analítica.