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Uma reflexão sobre a psicologia e os direitos humanos


O educador colombiano Bernado Toro costuma instigar o público de suas palestras com a seguinte indagação: “Qual a maior invenção do século XX? O que fará o século XX ser lembrado com destaque daqui há mais cem ou duzentos anos?”.

Na maioria das vezes, as respostas obtidas apontam para os avanços nas telecomunicações, na medicina e nos transportes. Satélites, computadores, internet, transplantes de órgãos, aviões supersônicos, viagens espaciais e por aí afora. Ou seja, os avanços científicos e tecnológicos surgem com destaque nas opiniões das pessoas.

Embora reconheça todos esses avanços, Bernado Toro diz que a maior invenção do século XX é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas, em dezembro de 1948. Para esse educador, este documento é a expressão de um conjunto de princípios e valores que estabelecem os pressupostos para a construção de uma vida digna para todos os seres humanos,

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e, dotados que são de razão e consciência, devem comportar-se fraternalmente uns com os outros.” Sem distinção de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição. Este é um ideal que perseguimos a duras penas durante todo o desenvolvimento da humanidade.

Conforme apontado por Bernado Toro: A Declaração Universal dos Direitos Humanos é um projeto de humanidade, o primeiro e mais consistente que já conseguimos sonhar. Transformar esse projeto em ações, usos e costumes é o maior desafio da família humana.” Aqui entra o papel da psicologia enquanto zeladora deste projeto, apontado por Toro como uma das maiores conquistas da humanidade no século XX.

Assim, este projeto de formação de uma nova sociedade carece acima de tudo de práticas profissionais e científicas que assegurem o desenvolvimento da consciência humana, como a única forma de mantermos intactas a razão e o discernimento que nos guiarão pelas trilhas do desenvolvimento durante os séculos afora. Contudo, sem perdermos pelo caminho nossa essência manifestada, sobre todas as conquistas, neste projeto de humanidade que representa a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”.

Gostaria de frisar aqui os dois primeiros dos trinta artigos que regem esta declaração, e dos quais podemos nos beneficiar no convívio diário com nossos semelhantes e diferentes, buscando aprender o significado destas palavras em nossas ações e atitudes, assim como nos próprios pensamentos e sentimentos que as norteiam.

As palavras chave que guiam estes princípios são a dignidade e a tolerância, como um direito e um dever para com a família humana. No sentido que se apresentam como a cláusula pétrea do contrato de relacionamento com todos os demais seres, também dotados de consciência e razão, e que a partir destas características fundamentais, também sejam reconhecidos como seres humanos.

A palavra contrato na sua essência significa um trato em conjunto (con-trato), ou seja, me trate como eu te trato. Isto está na base de qualquer pensamento e  comportamento ético. Assim, a Declaração Universal dos Direitos Humanos em sua essência implica que para sermos dignos de nos tornamos humanos precisamos ser tolerantes para com os demais seres humanos. Assim, o princípio da dignidade implica no exercício da tolerância em todos os sentidos. Vejamos os referidos artigos:

Art. 1º: Pelo fato de ser um representante da família humana, cada pessoa possui os mesmos direitos humanos que qualquer outra pessoa, em qualquer parte do mundo. Ninguém – nem mesmo o Estado – poderá denegar esses direitos.

A dignidade humana é o fundamento dessa universalidade dos direitos humanos. Independentemente das nossas diferenças culturais, políticas, econômicas e sociais, somos absolutamente iguais em uma dimensão fundamental: a dignidade.

Art. 2º: Os direitos humanos devem ser respeitados por todos, sem distinção de qualquer espécie. O respeito aos direitos humanos nos convoca ao exercício de uma virtude milenar: a tolerância. Ser tolerante é aceitar a possibilidade de que a verdade ou parte dela esteja em outro lugar que não nas convicções e tradições dentro das quais fomos educados.

Pontuamos apenas estes dois artigos para ilustrar o tamanho da complexidade que envolve o exercício destes dois valores tão básicos e fundamentais para o desafio de colocar em prática este projeto de humanidade. Principalmente quando pensamos que para sermos tolerantes é preciso reconhecer, aceitar e praticar o fato de que a verdade ou parte dela esteja em outro lugar que não nas convicções e tradições dentro das quais fomos educados.

Isto implica acima de tudo no exercício da relatividade, ou seja, de percebermos que a realidade é uma mera questão de ponto de vista. Lição tão nobre deixada pelo estimado físico Albert Einstein na sua teoria da relatividade, porém, apesar de tão fundamental e elementar, ainda não foi percebida o imperativo desta lei, nos reinos que ultrapassam os estudos da física ou de outras ciências exatas.

Assim, O princípio de relatividade se mostra como uma lei fundamental para o exercício da própria humanidade. Quando refletimos na sua própria declaração percebemos que todas as ciências deveriam se estruturar nesta máxima, a de que nenhuma verdade é absoluta.

Partindo da Física, reconhecida como a mãe das ciências, adentrando-se nos ramos das ciências humanas, passando pela Filosofia que desenvolveu um berço de conhecimentos seculares, e a Antropologia que nos ensinou a colocar em prática o relativismo, através dos estudos etnográficos que vieram desconstruindo ao longo do século XX muitas visões etnocêntricas, resumidamente àquelas que acreditam que o seu ponto de vista é o centro do universo.

Desta forma, a Psicologia, como irmã mais nova destas ciências, também busca dar sua contribuição através de sua prática profissional e de pesquisa com os recursos técnicos e clínicos que auxiliem no desenvolvimento do nosso nobre desafio que implica na construção deste projeto de humanidade.

Acreditamos que a maior contribuição da prática e ciência psicológica para este projeto se dá no sentido da ampliação da percepção humana sobre os valores da dignidade e tolerância no exercício do convívio cotidiano. Atuando, sobretudo, no zelo e cuidado sobre a razão e a consciência humana, compreendendo-os como a base da integridade que permite o exercício destes valores. Como lembra Eleanor Roosevelt, Presidente da Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos:

Onde, afinal, começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares próximos de casa – tão próximos e tão pequenos que não aparecem em nenhum mapa. Nas vizinhanças onde moram as pessoas, nas escolas que freqüentam, na fábrica, na fazenda ou escritório onde trabalham. Esses são os lugares onde cada homem, mulher ou criança busca a justiça, a igualdade de oportunidades e a dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado nesses locais, eles não terão qualquer significado em nenhum outro lugar.”

Assim, finalizamos destacando que o papel da psicologia é o de reafirmar em sua prática o seu compromisso social com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que “nos seus trinta artigos, é a síntese de um projeto de humanidade: os seus propósitos são o fundamento de uma nova ética, são um conjunto de princípios e concepções sobre os quais devem se sustentar os usos e costumes que pautam a existência humana. Novas maneiras de ser e conviver devem ser construídas cotidianamente a partir desse conjunto de direitos, deveres e liberdades.” (Art. 30º)

O que significa que “a dignidade da vida deve ser sempre traduzida no princípio de que nenhuma vida vale mais que outra e que isso implica o direito de todo ser humano a condições que lhe assegurem a sobrevivência, o desenvolvimento pessoal e social e a integridade física, psicológica e moral. Em todos os espaços da sociedade. Por todos e para todos os cidadãos.”

Parabenizamos desta maneira, todas as psicólogas e todos os psicólogos que atuam no zelo e cuidado dos direitos humanos, através da manutenção e desenvolvimento de práticas que beneficiam a integridade psicológica e moral de indivíduos, comunidades e sociedades.

Enfatizando acima de tudo o compromisso com a dignidade humana através do exercício de uma prática referenciada na tolerância e desmistificação dos preconceitos e crenças que não contribuam para um exercício saudável da própria integridade humana e do desenvolvimento dos seus potenciais.

E a todos àqueles que possibilitam o desenvolvimento de um terreno fértil para a qualidade de vida, restabelecendo as condições psicológicas que permitam que os valores fundamentais para o desenvolvimento da humanidade sejam colocados em prática a cima de quaisquer circunstâncias.

Referências: As bases éticas da ação socioeducativa: referenciais normativos e princípios norteadores / Coordenação técnica Antonio Carlos Gomes da Costa. -- Brasília : Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2006.

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