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O impacto do processo de mudança climática na saúde mental

    

    A partir das recentes catástrofes ambientais vivenciadas no estado do Rio Grande do Sul no mês de maio de 2024. Os profissionais de psicologia têm percebido uma significativa mudança comportamental e emocional no âmbito individual e coletivo em relação às alterações do clima, mesmo em regiões distantes do epicentro da tragédia ocorrida no sul do Brasil.

    As pessoas impactadas diretamente por este evento climático extremo, como as que perderam seus entes, casas, bens e patrimônios estão vivenciando este trauma numa proporção inimaginável para grande parte da população. Estas pessoas levarão consigo os registros desta experiência extrema, podendo sofrer de sintomas bem específicos do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), a partir de gatilhos emocionais relacionados às alterações climáticas como um todo. Uma vez que esta população se encontra em condição de vulnerabilidade geográfica e psicológica a partir do nível de exposição que tiveram a esta experiência de pico.

    São casos que necessitarão de atendimento e acompanhamento psicológico sistemático e em alguns casos psiquiátricos para o tratamento destes sintomas, o que já se configura como uma situação epidêmica no âmbito da saúde mental. Contudo, conforme pudemos observar durante a pandemia da Covid-19 no início da década de 2020, os sintomas traumáticos oriundos do estado de medo, muitas vezes até do terror e do pânico, têm a capacidade de gerar um fenômeno chamado de contágio psíquico.

    Devido a intensidade do alcance midiático, estes eventos podem tomar proporções psicologicamente devastadoras, principalmente com o advento das mídias sociais. Neste contexto, fica muito difícil utilizarmos estes meios para divulgar as informações que seriam úteis no sentido da prevenção e elaboração destes sintomas.

    De acordo com a visão da Psicologia Integral as experiências de pico trazem elementos específicos que podem acelerar ou regredir o desenvolvimento de potenciais humanos relacionados a capacidade de estimular tanto sentimentos de empatia como de apatia.

    Dois conceitos centrais desta abordem se referem aos estados de consciência e aos níveis de desenvolvimento psicológico que se inter-relacionam de uma forma orgânica e natural, podendo ser retroalimentados de uma forma positiva ou negativa de acordo com o processo psicológico individual e coletivo.

    Assim, podem se transformar numa verdadeira bola de neve que pode gerar tanto o efeito de um ciclo virtuoso na progressão do desenvolvimento psicológico, a partir de um estado de solidariedade e empatia. Tanto quanto de um ciclo vicioso no sentido regressivo, a partir do instinto de autopreservação que pode gerar um estado de anestesiamento e apatia a partir da dor do outro.

    Segundo o filósofo Ken Wilber, criador da Teoria Integral, o desenvolvimento da consciência humana se dá por meio de diversas linhas de inteligência com múltiplas capacidades, que seguem através de diferentes aspectos da nossa realidade tanto subjetiva e objetiva, quanto individual e coletiva.

    Neste sentido, o desenvolvimento integral do ser humano deveria contemplar todas as necessidades da nossa realidade como espécie. Para este autor as linhas de inteligências múltiplas estão referenciadas através de níveis de desenvolvimento específicos. Porém, a grande contribuição da Teoria Integral foi criar uma espécie de mapa que pudesse integrar todas estas teorias, padronizando os níveis de desenvolvimento da consciência humana a partir de uma escala que faz referência a capacidade de empatia.

    O psicólogo Abraham Maslow inicialmente falou sobre os aspectos positivos das experiências de pico, como as vivências prazerosas com a natureza e com outras pessoas que teriam a capacidade de relativizar as barreiras sensoriais entre nós e os outros, assim como com a natureza, gerando um sentimento orgânico de união, coesão e pertencimento.

    Ken Wilber aprofundou o conceito de experiências de pico de Maslow também como as situações de tragédias e catástrofes humanitárias que, a partir do sentimento de solidariedade, nos colocam para fora da zona de conforto do ego. Estas experiências extremas também podem ajudar a romper algumas barreiras sensoriais, nas quais a dor do outro é sentida como a nossa própria dor.

    Devido a nossa característica de mamíferos, possuímos um sistema límbico que realiza a função biológica e evolutiva de ajudar a coordenarmos com outros indivíduos as necessidades básicas para nossa sobrevivência. Uma vez que somos primordialmente animais sociais, e somente assim podemos sobreviver, evoluir e nos desenvolver neste planeta como espécie humana.

    Para Ken Wilber, os estados de consciência são passageiros e os estágios de desenvolvimento são permanentes. Isto significa que os estados emocionais de solidariedade que uma tragédia pode causar fluem através de ondas e passam naturalmente conforme voltamos para nossa vida normal. Porém conforme são integrados através de novas práticas individuas, padrões culturais e sistemas de prevenção podemos evoluir para níveis de empatia cada vez mais complexos.

    Isto adquire um significado profundo na experiência do Rio Grande Sul, uma vez que conforme as experiências de pico se tornam cada vez mais permanentes somos obrigados a refletir sobre o nível de consciência que estamos vivendo. O mapa de desenvolvimento humano proposto pela Teoria Integral, prevê três níveis básicos de consciência: egocêntrico (fechado nas próprias necessidades), etnocêntrico (fechado nos valores da sua própria cultura) e globocêntrico (capaz de relativizar as necessidades de todos os seres vivos)

    Como foi dito, vivenciamos igualmente e numa proporção cada vez maior durante estas experiências de pico, também alguns estados de apatia, que nos chocam exatamente por se darem neste contexto de extrema vulnerabilidade humana. Assim, a partir do processo inevitável de alteração climática, podemos literalmente progredir ou regredir enquanto espécie. Podemos citar dois aspectos centrais com um significado profundo no processo de elaboração simbólica da catástrofe que compartilhamos com o estado do Rio Grande do Sul.

    O primeiro é o caráter permanente da tragédia que nos coloca em um estado de suspensão relativo às necessidades ordinárias do cotidiano, o que coloca nossas prioridades e valores em perspectiva, nos forçando a refletir sobre o sentido do desenvolvimento a partir da perspectiva da preservação da espécie. O segundo é justamente a reflexão sobre a barreira sensorial que passamos a romper não somente com os seres humanos de outras culturas, mas também com as outras espécies.

    Uma vez que não podemos negar a influência da própria humanidade no processo de mudança climática através do período geológico conhecido como antropoceno, é inevitável a reflexão sobre os direitos básicos das demais espécies e da natureza, a fim de garantirmos a preservação da vida como um todo.

    Ken Wilber aprofundou a partir da sua relação com a psicologia humanista e transpessoal conceitos importantíssimos sobre a noção do desenvolvimento humano. Relacionou diversas áreas do conhecimento científico, integrando aos saberes das tradições milenares e ancestrais, nos quais fundamentou as bases da Teoria Integral. Nos fornecendo ferramentas e instrumentos para elaborarmos uma cartografia da mente humana, a fim de nos guiar por este mar de transformações pelos quais estaremos expostos nas próximas décadas.

    Gostaríamos de compartilhar da maneira mais abrangente possível, neste momento histórico delicado, os referenciais teóricos da Psicologia Integral e seus conceitos fundamentais. De uma maneira didática e acessível, para que possa servir como um guia para os profissionais de saúde e para a população em geral, no sentido de contribuir ao processo de elaboração simbólica individual e coletiva a todos aqueles que estão sendo afetados de uma forma sensível ao processo de mudança climática, pelo qual todos estamos expostos em algum nível.  

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Atendimento: Fábio Lessa Peres

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